Por: Luis Madi
Acompanhando o processo evolutivo da ciência e tecnologia de alimentos através do trabalho que desempenho no Instituto de Tecnologia de Alimentos (Ital) junto aos setores público e privado desde 1973, tive a oportunidade de vivenciar as enormes melhorias nos diferentes processos e produtos, em especial em relação à segurança do ponto de vista biológico, químico e físico.
Não posso, portanto, deixar passar despercebido esse tema no mês do Dia Mundial da Segurança dos Alimentos, celebrado em 7 de junho, considerando todas as vivências como pesquisador científico, diretor de unidade técnica, diretor geral, diretor de Assuntos Institucionais e coordenador da Plataforma de Inovação Tecnológica (PITec) do Ital, assim como a experiência de ter coordenado a Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios (Apta), responsável por liderar as instituições de pesquisa da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo.
De forma geral, observo uma grande dificuldade da população em captar a complexidade das ações e processos envolvidos para a garantia da segurança dos alimentos e bebidas que consome, ainda mais diante do fácil e constante acesso a inúmeras informações disseminadas pela internet, em especial pelas redes sociais.
Não por acaso, um grupo de 23 pesquisadores, coordenado pelo Ital, realizou em agosto do ano passado o desejo de vários anos do corpo técnico do Instituto de elaborar um documento dedicado ao assunto e disponibilizá-lo gratuitamente ao público em geral. Intitulado Brasil Food Safety Trends 2030, o estudo foi concebido seguindo a mesma linha de abordagem da Série Brasil Trends 2020.
No meu ponto de vista, o food safety é o item mais estratégico na engenharia de alimentos e pouco divulgado e entendido, assim ao abordá-lo adotamos uma linguagem simples, o que é um grande desafio para especialistas. Considero, portanto, que essa publicação foi um passo importante do Ital, alinhado à sua missão de contribuir para a evolução das áreas de alimentos, bebidas e embalagem em benefício do consumidor e da sociedade.
No Brasil Food Safety Trends 2030, coordenado pela diretora do Ital Eloísa Garcia, a abordagem sobre o tema abrange diferentes aspectos da produção, distribuição e comercialização. Com um olhar de quem atuou por décadas na área de embalagem, essa abrangência é fundamental num contexto em que o delivery está cada vez mais complexo em um mercado cada vez mais exigente que não para de crescer.
Detalhar aspectos sobre segurança e qualidade dos alimentos é importante, pois o consumidor não compreende quão fundamentais são para a garantia de sua saúde e bem-estar. Com esse objetivo, na construção do documento nos atentamos há vários pontos importantes presentes no dia a dia, que chamamos de drivers: mercados emergentes de alimentos; sistemas de produção e tecnologias não convencionais; tecnologia da informação; sistemas de embalagem e distribuição não convencionais; mudanças no perfil populacional; estresses do meio ambiente e sistema de saúde.
Aqui cabe lembrar que há 50 anos a alimentação ocorria basicamente em casa e hoje é comum fazermos refeições fora do lar e com maior mobilidade. Considerando a realidade atual, traçamos cinco macrotendências do food safety: ampliação do escopo de perigos e riscos; aumento da complexidade na gestão; interdisciplinaridade na governança; evolução do sistema regulatório; informação e educação.
Dentre elas, avalio como mais representativa a relacionada à regulamentação, pois houve uma excelente evolução, o que tem contribuído para a melhoria da qualidade dos produtos alimentícios. Ao me deparar com o atual cenário, fica difícil não lembrar como eram os sistemas de produção quando fiz mestrado em Michigan, nos Estados Unidos, com pessoas querendo produzir alimentos em casa com altos riscos de contaminação. Hoje nós temos problemas inerentes a qualquer negócio que não segue a legislação.
Destaco também a informação e educação, macrotendência cujas discussões no Seminário Brasil Food Safety Trends 2030 tiveram maior repercussão positiva junto aos participantes. Aliás, o Comer Com Ciência nasceu justamente pela necessidade dos especialistas em ciência e tecnologia de alimentos fazerem com que temas extremamente técnicos sejam compreendidos pelo público leigo: com linguagem simples e onde as pessoas estão frequentemente buscando informações.
Por fim, detalho a seguir a agenda positiva com foco na segurança dos alimentos proposta no Brasil Food Safety Trends 2030 para reflexão: o que você, ator do sistema de produção de alimentos, tem feito?
● estruturação de um mapa de capacidade nacional para investigação, geração de conhecimento, informação e apoio à gestão de food safety;
● disseminação de informações para promoção de uma cultura de inocuidade de alimentos;
● orientação de linhas de financiamento, públicas e privadas, como foco em food safety;
● articulação de redes de cooperação técnica e científica, públicas e/ou privadas, envolvendo academia, reguladores e setor produtivo;
● fomento à abordagem de ciência aberta para geração de conhecimento no contexto da investigação sobre questões de segurança de alimentos;
● estabelecimento e manutenção de um observatório de monitoramento de tendências e fatores de influência em food safety;
● formação e retenção de recursos humanos especializados nos temas correlatos;
● ampliação da infraestrutura física e capacitação técnica para desenvolvimento e aplicação de ferramentas de TI voltadas à gestão de food safety;
● evolução dos marcos regulatórios e sistemas de inspeção frente às necessidades da sociedade e do mercado, com vistas à garantia da segurança dos alimentos;
● definição e implantação de estratégias coordenadas para melhorar a comunicação com a sociedade sobre temas afeitos.
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