Painel do World Agri-Tech discute desafios e soluções de sustentabilidade no agro para transformar sistemas alimentares globais
A abordagem sistêmica para sustentabilidade no agro tornou-se prioridade diante dos desafios ambientais e sociais enfrentados globalmente. No recente painel “Adotando uma Abordagem Sistêmica para a Sustentabilidade Agroalimentar”, do World Agri-Tech Innovation Summit, ocorrido em San Francisco, especialistas destacaram que tal abordagem é necessária para lidar com desafios complexos, como emissões de gases de efeito estufa, desperdício de alimentos e uso excessivo de recursos naturais.
Participaram da discussão: Crystal Davies (Diretora Global do Programa de Terra e Água do World Resources Institute), Lila Preston (Chefe de Equity Growth da Generation Investment Management), Daniel Ryan (Presidente e CEO da CIBO), Jason Trusley (SVO da Land O’Lakes), Shobha Shetty (Diretora Global de Agricultura e Alimentação do Banco Mundial) e Michael Doane (Diretor Global de Sistemas Alimentares e de Água da The Nature Conservancy).
Importância da abordagem sistêmica e colaborativa no agro
Crystal Davies, do World Resources Institute, ressaltou na abertura do painel que “30% das emissões globais de gases do efeito estufa vêm do sistema agroalimentar, assim como 70% do uso de água doce e 90% do desmatamento”. Ela também destacou que cerca de um terço dos alimentos produzidos é desperdiçado da fazenda até a mesa.
Metade da população mundial depende do agro para subsistência, mas muitos agricultores lutam por renda digna. Para alimentar 10 bilhões de pessoas até 2050, a produção precisa crescer 50%, exigindo uma transformação radical que vá além de tecnologias isoladas. Shobha Shebby, do Banco Mundial, lançou o alerta:
“Do ponto de vista do Banco Mundial, o sistema agroalimentar, na nossa perspectiva, é realmente o conjunto completo de atividades por meio das quais produzimos alimentos a partir da agricultura. Isso inclui sete atividades essenciais: fornecimento de insumos para a agricultura, produção de culturas e pecuária nas fazendas, processamento de culturas e pecuária em alimentos e, claro, o armazenamento, varejo, consumo e descarte dos alimentos. Quando adotamos essa abordagem, fica claro que o sistema alimentar atualmente está falhando em alimentar o mundo, mas também está prejudicando o planeta.”
Diante dos desafios crescentes, é consenso entre os participantes do painel que não há mais espaço para ações isoladas. Crystal reforçou:
“Não podemos mais depender de práticas ou tecnologias individuais como solução. Temos que entender como todos os componentes do sistema interagem”
Jason Trusley, da Land O’Lakes, destacou o modelo cooperativo, citando que reúne 300 mil agricultores na empresa:
“Cooperativas alinham riscos e benefícios, democratizam decisões e impulsionam mudanças. Temos que trabalhar juntos nisso, e o sistema cooperativo força isso a acontecer, o que é uma abordagem realmente interessante para impulsionar a transição e a mudança. É democrático, baseado no mérito, e incorpora todos os princípios que acreditamos. As cooperativas são boas para construir uma cultura de capital, porém, elas também têm a capacidade única de posicionar a mudança ao alinhar incentivos, alinhar resultados e, por fim, levar a uma conclusão que beneficia o agricultor.”
Shobha complementou, citando projetos no Brasil que garantem empréstimos para agricultura climática:
“Reposicionar subsídios agrícolas (US$ 650 bilhões/ano) e ampliar financiamento climático são passos críticos”
Financiamento e incentivos para práticas de sustentabilidade no agro
Um dos grandes entraves para implementação de soluções sistêmicas é a falta de incentivos adequados. Daniel Ryan, da CIBO, destacou que é essencial criar estruturas claras de incentivo para agricultores:
“Não faremos essa transição sem incentivos. Os agricultores precisam ser incentivados, mesmo que haja benefícios no longo prazo”.
Jason acrescentou que a incerteza econômica e a falta de clareza sobre os benefícios diretos para o agricultor são grandes obstáculos. A falta de padrões para medir resultados dificulta a escala. O executivo criticou:
“Usamos carbono como moeda, não como resultado, desviando energia das mudanças reais. Precisamos de compromissos globais para financiar práticas regenerativas”.
Shobha reforçou a necessidade de sistemas de MRV (medição, relato e verificação) acessíveis para pequenos agricultores e criticou o baixo interesse dos investidores privados no setor:
“Um em cada três empregos no mundo está no sistema alimentar. E essa proporção sobe para dois em cada três nos países de baixa renda. Além disso, o sistema contribui com US$ 10 trilhões para a economia global, o que representa mais de 12% do PIB mundial. Para nossa instituição, cuja missão é a redução da pobreza e um planeta habitável, esse é o sistema, esse é o setor que pode reduzir a pobreza duas a três vezes mais rápido do que qualquer outro setor. Por isso, sua importância. Nossa visão é construir um sistema alimentar mais produtivo, resiliente e sustentável. Sabemos que isso é viável e acessível. Estimamos que o custo da transformação seja de cerca de US$ 500 bilhões por ano nos próximos 10 anos, o que representa apenas 0,5% do PIB global.”
Já Daniel Ryan sugeriu tratar segurança alimentar como prioridade nacional, comparável a investimentos em defesa realizados por organizações internacionais como a OTAN, afinal fome é enquadrada como um problema de segurança pública, com extensão e impactos mundiais.
Michael Doane propôs “financiamento de projetos de transição” com prazos por décadas, inspirado em modelos de conservação.
Lila Preston destacou:
“As soluções biotecnológicas, como biofertilizantes e cultivos resilientes, são como pilares de uma “segunda revolução verde”.
Tecnologias e soluções de aplicáveis no agro
Shobha apresentou soluções concretas para o setor agrícola baseadas em inovação tecnológica, destacando exemplos na África e no Brasil que combinam tecnologias digitais, financiamento climático e agricultura inteligente. Segundo a executiva, a inovação tecnológica é chave para escalar soluções, destacando o imenso potencial do mercado de carbono para dirigir investimentos. Mencionou, como exemplo, aplicativos de IA para diagnóstico de solos no Quênia e garantias de US$ 1 bilhão para agricultura climática no Brasil. A executiva destaca:
“Precisamos de sistemas de medição e monitoramento mais baratos e eficientes para acessar mercados de carbono com alta integridade”
Desafios locais e ações globais
Michael Doane, da TNC, propôs “financiamento de projetos de transição” com prazos longos, inspirado em modelos de conservação. Lila Preston destacou soluções biotecnológicas, como biofertilizantes e cultivos resilientes, como pilares de uma “segunda revolução verde”.
Michael destacou que a implementação de uma abordagem sistêmica precisa ser adaptada ao contexto local, propondo “Foodscapes” como uma forma de análise detalhada por região, que ajuda a encontrar soluções específicas e viáveis. O executivo destaca:
“Precisamos de inovações financeiras que criem clareza sobre a infraestrutura e insumos necessários para uma transição sustentável”.
A conclusão do painel reforça a necessidade urgente de colaboração entre diferentes atores da cadeia agroalimentar, governos e iniciativa privada, para garantir que a abordagem sistêmica para sustentabilidade no agro deixe de ser apenas uma discussão e torne-se uma realidade.






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