O estudo “Money Well Spent?” traz o alerta revelando que os dois maiores fundos climáticos globais não estão direcionando recursos diretamente para organizações de pequenos agricultores familiares, onde seu impacto seria mais significativo.
A divulgação do estudo ocorreu durante o Dia da Alimentação, Agricultura e Água, na COP29 – Cúpula do Clima das Nações Unidas, realizada no Azerbaijão. Serve de referência para os trabalhos que devem ser realizados ao longo de 2025 na preparação para a COP30, no Brasil.
Exclusão dos agricultores familiares
A pesquisa, conduzida pela Family Farmers for Climate Action — uma aliança que representa mais de 50 milhões de agricultores na África, América Latina, Ásia e Pacífico — destaca que os agricultores familiares estão excluídos dos processos decisórios e não têm acesso direto ao financiamento.
Dos 40 projetos analisados, financiados pelo Global Environment Facility (GEF) e pelo Green Climate Fund (GCF), nenhum direcionou recursos diretamente para agricultores familiares ou suas organizações. Além disso, menos de 20% desses projetos incluíram agricultores na definição de prioridades, design e implementação.
Barreiras ao acesso de recursos
O estudo identificou múltiplas barreiras nos processos do GCF e do GEF que impedem organizações de base de acessarem fundos, incluindo procedimentos de aplicação complexos e demorados.
Por exemplo, as solicitações de financiamento do GCF exigem até 22 documentos de suporte, como verificações de antecedentes criminais de todos os funcionários das organizações de agricultores.
Se forem somadas as dificuldades de conectividade dos pequenos agricultores, o problema se torna ainda mais grave.
Financiamento insuficiente para práticas sustentáveis
Entre 2019 e 2022, apenas um terço dos US$ 2,6 bilhões gastos pelo GEF e GCF em agricultura, pesca e silvicultura foi destinado a ajudar pequenos agricultores a adotarem práticas sustentáveis e resilientes ao clima.
Isso é alarmante, considerando que esses agricultores produzem 70% dos alimentos consumidos na África e até 80% na Ásia, sendo fundamentais para cadeias de suprimento globais de commodities como arroz e café.
Segundo o relatório, chegar a um novo e ambicioso objetivo de financiamento climático deveria estar no topo da agenda da COP29. Criar um sistema alimentar mais resiliente e sustentável terá um custo estimado entre US$ 200 e 500 bilhões por ano, mas gerará benefícios para a saúde, os meios de subsistência e o meio ambiente de US$ 5 a 10 trilhões por ano.
Garantir que o financiamento disponível seja bem utilizado é igualmente importante. Apenas 14% (US$ 1,3 bilhão) do financiamento climático público internacional para agricultura e uso da terra foram direcionados a pequenos agricultores em 2021-2022. Isso representa uma fração do valor estimado de US$ 170 a 189 bilhões necessários anualmente.
Impacto das mudanças climáticas na agricultura
Eventos climáticos extremos estão prejudicando colheitas em diversas regiões. No sul da África, uma seca considerada “uma vez em um século” destruiu 70% da colheita da Zâmbia.
Na Ásia, tempestades e inundações danificaram mais de 50.000 hectares de terras agrícolas nas Filipinas.
No Brasil, o problema igualmente pode ser verificado, com secas extensas na região amazônica e inundações nos estados do Sul do Brasil.
Necessidade de ação imediata para suporte aos pequenos agricultores familiares
Stephen Muchiri, CEO da Federação de Agricultores da África Oriental (EAFF), enfatiza: “Precisamos de um acordo financeiro ambicioso na COP29 para proteger nosso sistema alimentar e garantir que todos tenham o suficiente para comer em um clima em mudança. É igualmente importante que qualquer financiamento disponível seja bem gasto, direcionando recursos diretamente para agricultores familiares e para abordagens sustentáveis e resilientes que a ciência demonstra serem essenciais para a adaptação.”
Os dados apresentados no relatório são ótimos indicadores para que os governos, entidades ligadas ao agronegócio, empresas de crédito e financiamento dediquem atenção para formular mecanismos que facilitem o acesso dos pequenos produtores aos recursos financeiros necessários para a produção de alimentos.
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