Relatório da FAO mostra que oferta mundial de carnes oriundas da pesca e da aquicultura avançou; Brasil tem potencial para expandir produção.
Por Xico Graziano
Atenção, ocorreu um marco na história da alimentação mundial: a produção de pescado ultrapassou a pesca de captura. O fato consta do mais recente relatório da FAO (Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura) sobre a aquicultura.
Somando-se a pesca tradicional com a produção aquícola, foram ofertadas 223,2 milhões de toneladas de alimentos em 2022, sendo 185,4 milhões de toneladas de animais aquáticos (peixes, crustáceos e moluscos, principalmente) e 37,8 milhões de toneladas de algas.
Mostra a FAO que a aquicultura mundial, excluindo- se o cultivo das algas, respondeu em 2022 por 51% da produção de animais aquáticos, principalmente peixes (piscicultura), camarões (carcinocultura), ostras (ostreicultura), polvos (octopodicultura), mexilhões (mitilicultura) e vieiras (pectinicultura).
Em termos per capita, a oferta mundial dessas carnes oriunda da pesca e da aquicultura atinge aproximadamente 23 kg/ano, representando metade da produção mundial per capita de carnes de outros animais (45 kg/ano). Aves (39%), suínos (34%) e bovinos (21%) lideram entre as 365 milhões de toneladas produzidas em 2023.
Para nós, brasileiros, que ainda consumimos poucos pescados, e nos acostumamos a ter a carne bovina na mesa, é surpreendente verificar que o volume de carne de animais aquáticos, pescados ou produzidos, ultrapassa em 2,4 vezes a produção mundial de carne bovina, que monta a 76 milhões de toneladas (2023). Quer dizer, o peixe nada de braçada sobre o bife no mundo.
Destaca-se a aquicultura realizada em águas continentais (doce), com 62,6% do total produzido, cabendo 37,4% à maricultura. Existem diversos sistemas de criação, utilizando dezenas de espécies. Todos eles conquistaram incríveis índices de produtividade por área ocupada, com custos decrescentes. Sorte da humanidade. Bom para o meio ambiente.
A civilização sempre esteve muito dependente dos oceanos e mares para extrair o pescado, alimento proteico historicamente importante para a população. Com o contínuo crescimento demográfico, a pressão da pesca passou a ameaçar os cardumes naturais,
Em caráter ornamental, a criação doméstica de carpas remonta à China de 4.000 anos atrás, sendo relatada também no Império Romano. Só em 1842, porém, na França, o mecanismo de fecundação artificial em salmões é descoberto. Quase 1 século depois, em 1934, no Japão se logra obter larvas de camarões em laboratório.
Tais descobertas científicas criaram as bases da moderna piscicultura, que se desenvolveu dominando as técnicas de alimentação e de controle de doenças nos criatórios. Até que, agora, ultrapassou a pesca tradicional de captura.
No Brasil, a criação de peixes remonta aos holandeses, que implantaram no século 18 alguns viveiros no Nordeste. As pesquisas científicas, porém, se iniciaram na década de 1930 por obra do visionário cientista, nascido no Rio Grande do Sul, Rodolpho von Ihering, conhecido como o “pai da piscicultura” nacional.
Funcionário do Dnocs (Departamento Nacional de Obras Contra a Seca) e interessado na utilização dos açudes nordestinos para a produção de proteínas, Rodolpho von Ihering pioneiramente descobriu como estimular a glândula hipófise de peixes nativos, visando à sua reprodução em laboratório.
O Brasil expandiu sua aquicultura continental pelos enormes reservatórios de hidrelétricas e pelas zonas costeiras. A produção de peixes atinge 887 mil toneladas (2023), com destaque para o sucesso da tilápia (65,3% do total), tendo o Paraná como principal produtor. O país já é o 4º produtor mundial de tilápia, atrás de China, Indonésia e Egito. Importantes cultivos existem com outras espécies nativas, dentre elas o tambaqui, o pintado e o pirarucu.
Avançaram também no país as fazendas de camarão, ocupando áreas no Nordeste, e, no litoral do sul e sudeste, assentaram-se cultivos de ostras e mexilhões. No geral, porém, o Brasil ainda está longe de aproveitar seu enorme potencial da aquicultura. Restrições ambientais, nem sempre justificadas, limitam a carcinocultura no Nordeste, bem como a aquicultura marinha.
Em contrapartida, os asiáticos encontraram na aquicultura uma solução para sua demanda por proteínas e crescem exponencialmente seus criatórios. Liderados por China (36%), Índia (8%), Indonésia (7%) e Vietnã (5%), os países asiáticos respondem por 70% da produção mundial de organismos aquáticos.
Na África, também se nota relativa expansão, especialmente no Egito; já a Europa e a América Latina/Caribe se distanciaram desse movimento. Só Peru, Chile, Equador e Noruega são citados entre os destaques da aquicultura mundial.
Chegaremos lá.
Xico Graziano é engenheiro agrônomo e doutor em administração. Foi deputado federal pelo PSDB e integrou o Governo de São Paulo. É professor de MBA da FGV.
Artigo compartilhado com autorização do autor.
Confira o documento da FAO na íntegra:
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