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O título pode parecer estranho, ainda mais para quem não sabe que Kemet é o verdadeiro nome do Egito, país localizado no norte da África. Os keméticos foram os primeiros a sistematizar o conhecimento sobre a cultura de videiras e a realizar a produção do vinho. É bem fácil notar o tom de pele negra dos egípcios, raça que predominava na região, nas milhares imagens iconográficas.

Somando a tantas outras iniciativas pioneiras, incluindo serem primeiros pensadores, os primeiros astrólogos, o vinho fez parte dos hábitos de consumo e de cerimoniais. Evidências apontam que o vinho era sinônimo de riqueza e poder.

Mônica Faria, professora e historiadora especialista em relações étnico raciais, compartilhou estas informações em um dos eventos da Confraria das Pretas. Os keméticos já produziam vinhos bem antes do famoso Deus Baco.

Em Kemet, o solo era bastante fértil, o que permitia o cultivo das videiras. Com isso, eles produziam os próprios vinhos e os deixavam reservados em ânforas. As safras ficavam inscritas nas próprias ânforas.

A presença de uvas no Egito está datada desde o Pré-dinástico (4000-3500 a.C.) nas estações arqueológicas de Tell Ibrahim Awad e Tell el-Fara’in, ambas no Delta do Nilo.

Imagem do Egito, com destaque para a a região onde deviam ser cultivadas as videiras – Google Earth

Como as uvas eram cultivadas no Antigo Egito

A vinha era plantada junto ao Nilo, numa zona não alcançável pela inundação anual do rio. Inicialmente era cultivada na região do Delta e posteriormente no Reino Novo foi-se expandido para os Oásis do deserto ocidental e para o Vale do Nilo. Durante o Reino Novo, a região vinícola mais importante era denominada “Rio ocidental”, fazendo referência ao nome do braço mais ocidental do Nilo, o antigo braço Canópico que desembocava junto à atual cidade de Alexandria. Atualmente, este braço do rio já não existe, conservando-se dos sete que existiam inicialmente apenas dois: Roseta e Damieta.

A vindima tinha inicio aos finais de julho quando no céu aparecia a estrela Sotis que os egípcios associavam ao inicio da inundação, uma vez que a subida das águas coincidia com o seu surgimento. As águas do Nilo nesse período adquiriam um tom vermelho devido à grande concentração de sedimentos ferruginosos provenientes do Nilo Azul da região de Atbara, nas montanhas da Etiópia.

A cor é associada pelos egípcios ao sangue do Deus Osíris, deus agrícola e da ressurreição. Segundo a mitologia, foi encontrado pela sua mulher Isis e pela sua irmã Neftis, morto no Nilo. Por essa relação com a cor vermelha do Nilo e com o sangue de Osíris, e devido também às pinturas das tumbas que mostravam uvas pretas, considerava-se que o vinho que se elaborava no Egito seria tinto.

Vindima e elaboração do vinho: à direita, a vinha em forma de arco e a uva de cor preta, dois trabalhadores recolhem a uva com as mãos e colocam-na em cestos; à esquerda, cinco homens a pisar a uva dentro do lagar e vemos um sexto homem que recolhe o liquido que sai do tanque e que é de cor escura, avermelhada. Por cima, quatro ânforas de vinho já fechadas. Tumba de Nakht [TT 52] em Sheikh Abd el Qurna, Tebas Oeste, 18a Dinastia, Reino Novo (imagem de Davies, 1917: lâmina XXVI). Fonte: Estudo Nehmaat.

A Iconografia do vinho no Antigo Egito

Para entender melhor o processo de fabricação do vinho no Antigo Egito, a fonte mais utilizada é a iconográfica. Estes materiais estão fartamente inscritos em diversos monumentos no Egito, e podem dar ótimas indicações sobre a produção e consumo do vinho.

Segundo o estudo Nehmaat, publicado na Revista Mundo Antigo, “nas cenas de viticultura e vinificação os egípcios deixaram plasmadas as diferentes etapas do processo de elaboração do vinho. No entanto, muito raramente temos o procedimento completo representado numa mesma tumba: trabalhador regando a vinha, trabalhadores colhendo a uva à mão e colocando-a em cestos que são depois transportados, uma vez contabilizados por um escriba, até ao lagar onde homens pisam a uva descalços”.

Posteriormente o líquido era colocado no interior de jarras de cerâmica para fermentar. Uma segunda prensa de saco era também utilizada para recolher os restos de peles e sementes.

Há ainda a representação das ânforas a serem tapadas e seladas e, finalmente, a serem transportadas para o celeiro onde ficavam até serem escolhidas para consumo diário (banquete, festividade), oferenda ou para acompanhar o Faraó defunto no seu caminho para o além.

As descobertas de vinhos não param no Egito

Há poucos dias, foram encontradas dezenas de ânforas lacradas contendo vinho e fragmentos de sementes de uvas junto à tumba da rainha Meret-Neith, que viveu há cerca de 5 mil anos. A grande quantidade de ânforas indica que a a rainha era muito poderosa, possivelmente a primeira mulher a ser faraó.

Todos os achados estão sendo avaliados por cientistas para poder definir melhor todas as práticas de vinificação e cultura de uvas.

Ânforas de vinho encontradas na tumba de Meret-Neith
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