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Saborear um vinho é sempre bom, ainda mais quando acompanhado de outras pessoas, amigos. A escolha do vinho é sempre muito pessoal, não importa se é doce, seco, refrescante ou frutado. Tudo faz parte da celebração da alimentação, tem que fazer sentido para a pessoa e o momento, para acompanhar uma refeição, por puro prazer de degustação ou para uma celebração.

Para a comunidade negra, chegar até essa fase prazerosa de beber o vinho requer ultrapassar alguns desafios. O primeiro, é na compra nas redes de varejo. A dificuldade não se limita na escolha de uma garrafa, entre dezenas disponíveis na gôndola: é fácil ocorrer a abordagem de um segurança da loja, perguntando se deseja alguma “ajuda”.

A discriminação no mundo dos vinhos existe e se torna mais visível quando a atividade demanda contato com o público. Não são todas as lojas especializadas de vinhos, redes de varejo, empresas que promovem ações de degustações e restaurantes com sommeliers que contratam pessoas negras para exercer as funções.

Silvana Aluá, passou por algumas situações dessas desde que fez o curso de degustação de vinhos no Senac. Ela comenta que seus colegas de turma achavam que ela era bolsista no curso por ser negra (bolsistas e cotistas são discriminados). Na verdade, apostava forte na sua formação, tanto que buscou empréstimo bancário para pagar o curso.

Somando em sua profissionalização mais cursos de degustação e de sommelier, atuando como promotora de marcas de bebidas em redes de varejo e participando de eventos de enologia, conseguiu entender melhor as preferências do público. Tudo para aprofundar seus conhecimentos e experiências.

Quilombo urbano, para divulgar a cultura do vinho e discutir temas de diversidade

Silvana hoje se firma à frente da iniciativa Confraria das Pretas, iniciativa fundada em 2017. É praticamente um quilombo urbano com sede em São Paulo e com atuação em qualquer local do país.

A Confraria das pretas reúne grupos de diversidade (não são somente negros), com pessoas que gostam de vinhos e que não tinham acesso ou locais para conhecer melhor a bebida e, consequentemente, tinham dificuldade em escolher vinhos nos pontos de vendas. E aproveitam os encontros para conversas abertas e francas.

“Estamos resgatando a verdadeira história da relação cultural da comunidade negra com os vinhos e alimentos. No início, a Confraria era uma roda de amigos, para passar informações e trocar experiências”, explica Silvana. A cada reunião, as pessoas do grupo chamavam outros conhecidos, e o grupo não parou de crescer.

No contexto da experiência com os vinhos, as pessoas de diversas profissões comentavam dos problemas nas empresas de promoção para cargos e para a evolução profissional. A Confraria começou a chamar outras pessoas especialistas para participar, de outras áreas, para fazer workshops sobre temas profissionais, arte, cultura em geral, promovendo diálogos sobre temas raciais. cresceu e fortaleceu a confraria.

Os encontros ocorriam uma vez por mês. Eram sempre eventos itinerantes, em bares e restaurantes que gostam da proposta e acolhiam o grupo que chegava a mais de 100 pessoas por evento. “Não ando só. A filosofia de quilombo trabalha muito a oralidade, sentar em roda, promover boas conversas e discutir sobre tudo”, explica Silvana.

A pandemia levou a Confraria das pretas para o online, expandindo os encontros para todo o país. Silvana comenta que foi nesse momento que a Confraria ganhou muito impulso e projeção no País. Hoje, no modo presencial, as empresas chamam para dar suporte local quando fazem eventos pelo país.

Fomentando a educação e profissionalização

A Confraria quer ajudar a comunidade, para montarem seus próprios negócios, expandir o conhecimento. Para tanto, trabalham capacitando novos profissionais para irradiarem o conhecimento e as oportunidades para melhorar atuação no mercado.

Os certificados de especialização em degustação de vinhos abrem muitas portas. No entanto, os internacionais são muito caros, um investimento inacessível para muita gente evoluir profissionalmente. O mercado dá preferência para profissionais que já trabalham na área e que tenham as certificações.

A Confraria atraiu a atenção da Fundação Gérard Basset. A fundação doa recursos financeiros e conhecimento para promover educação, treinamento e mentoria para pessoas que não podem pagar os cursos e certificação internacional. Contemplam grupos sociais que sofrem discriminação e social e econômica.

A escola de vinhos Celebrare executa os programas educacionais no Brasil, alinhada com a fundação. Dispõe de bolsas de estudo para os alunos locais selecionados pela Confraria, que passam a ter acesso às caras certificações internacionais. A escola promove no Brasil a formação de sommelier. A proposta é desenvolver o mercado, com foco nas minorias.

A Confraria montou um comitê de seleção de candidatos, e levou consultores à escola para que os professores aprendessem a se comunicar e a dar o letramento correto, desde o apoio processo admissional.

A primeira turma se formará com 20 alunos. Destes, 10 receberam suporte bolsista da Celebrare e outros 10 pela Fundação. Os formandos receberão duas expressivas certificações internacionais.

Os alunos veem novas aberturas para oportunidades de trabalho. Já conseguiram empregos em restaurantes, lojas e resorts. Adicionalmente, conseguiram nivelar os valores de pagamento pelos serviços com outros profissionais com mesmas certificações internacionais.

Confraria das pretas olhando o futuro inclusivo

“O Grupo Confraria reúne entusiastas que gostam de trocar ideia sobre vinhos, com acolhimento. Conversar, expor eventualmente problemas que sobre com racismo. Futuramente, usaremos libras em nossos encontros para aproximar mais pessoas que sofrem com a exclusão”, ressalta Silvana.

Hoje conta com 10 pessoas dando suporte, incluindo sommeliers e assistentes, para dar conta das demandas de cursos e eventos em todo o país.

Em breve, terá uma área de recrutamento e seleção para apoiar os profissionais e conectá-los com empresas, que hoje os procuram pedindo indicações. O Grupo Confraria formalizará a oferta de profissionais qualificados no mercado.

O enoturismo é outra área onde deseja crescer. Já promove o Rolê do Vinho, juntando um grupo numa van para rodar em bares de vinhos onde promovem sessões de degustações de vinhos e harmonização com alimentos. Futuramente, iniciará o roteiro em vinícolas.

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